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Se tem uma coisa que não cessa nesta vida é problema – sem dramatizar, sem rabugices, mas esta é a realidade. Sofremos pelo que temos, pelo que não temos. Traçamos ideais de vidas plenas e felizes. Mas, na prática, convivemos muito mais com a falta do que com a abundância. Esse é o resultado da cultura de desejo, que nos absorve.
Faz parte deste pacote entendermos que o outro deveria estar mais disponível para nosso mal estar. Deveria ouvir mais, ajudar mais. Compadecer-se da nossa situação. Deveria fazer mais por nós. Não custaria nada. E assim endossamos a ideia de injustiça – e, neste balcão, costumamos nos posicionar no lado das vítimas.
Okay, vou te ajudar. Do que você precisa? “Tá tudo ruim.” Não, isso não é possível. Mas, vamos lá. Por onde podemos começar? Qual a sua prioridade? Você já avaliou as ferramentas que dispõe para enfrentar seus obstáculos? Há quanto tempo eles moram aí? Como chegaram a este tamanho? Um silêncio se faz. A cara feia denuncia o desconforto.
Gratificação e recompensa
O que poucos admitem é que a ajuda que se requisita é, na verdade, uma estratégia para adiar soluções, que só existem dentro de nós mesmos. Quando estamos verdadeiramente empenhados a um objetivo, tudo se faz recurso. Quando estamos na má vontade, qualquer coisa é empecilho.
A consciência é resultado da nossa capacidade de reflexão. E refletir incomoda, perturba, traz sofrimento. Isso porque nos deparamos com aquele lado que preferíamos desconhecer de nós próprios. Um deles é a nossa capacidade (infinita) de alimentar dificuldades, em vez de solucioná-las.
E por que fazemos isso? É simples. No fundo, a gente gosta. É o velho mecanismo de recompensa – se algo nos oferece alguma gratificação, tendemos a buscá-lo por repetição, até que um novo estímulo mais aprazível tome o lugar. Esse mecanismo não cessa espontaneamente.
Razões para existir
Muitas vezes, nos afeiçoamos às complicações por encontrar nelas uma razão para existirmos. No embaraço, encontramos justificativa para sermos alguém. É a história que temos para contar. Isso faz com que, inconscientemente, cuidemos para que o problema não seja sanado. E isso é mais comum do que podemos imaginar. Toda vida carece de sentido e nem sempre estamos empenhados em encontrar um significado mais profundo para viver.
Inclusive, a ajuda reclamada nem sempre é bem-vinda. Por esse motivo, é importante saber separar as demandas, esperar o pedido, agir de forma gradativa. Não podemos arrancar do outro aquilo que pode ser a sua âncora mais segura com a realidade.
É preciso ter sensibilidade para perceber o momento oportuno para estender a mão. Caso contrário, será inútil ou até mesmo nocivo. E não esquecer: em alguns casos, a melhor contribuição é negar aquilo que lhe pedem.
Da mesma forma, seja honesto consigo antes de incomodar quem quer que seja com seus problemas. Às vezes, aquela barreira intransponível é aquela solução óbvia que você se nega a aceitar. O diálogo é importante para nos fazer questionar nossos pontos cegos. O outro pode nos levar a caminhos aonde não chegaríamos sós. Favor não confundir isso com despejar nos demais suas mazelas. A convivência saudável agradece.