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Psique: Previsões de ano novo – sua vida será melhor

Crédito: Metrópoles

previsões reveillon

Pratico a leitura do tarot há alguns vários anos. A agenda aperta nesse período de transição entre os anos: muitos procuram os oráculos na tentativa de antever as surpresas do novo período que se aproxima. Infelizmente, frustro a expectativa de grande parte dos clientes. Não por minha vontade, que fique bem claro. Mas porque não dá para pensar numa próxima fase, sem que tenhamos quitado as pendências da anterior. E a leitura acaba por explicitar essa cobrança.

As situações que “emperram” o caminho costumam se repetir: conversas evitadas, promessas não cumpridas, relacionamentos disfuncionais, acúmulos desnecessários, ambições inapropriadas… Sofremos com tudo isso quando deixamos de ouvir o que brota da própria essência.

Capricho com quem chega dizendo que “se tiver coisa ruim, nem precisa dizer”. As pessoas vislumbram no futuro a chance da dita “boa vida”. Esse conceito engloba a prosperidade espontânea, amores ardentes e fiéis, inteligência notória, talentos reconhecidos, corpos sedutores, filhos extraordinários… E tudo isso à base de sorte – espontaneamente, ou com um mínimo de esforço.

Não percebem, com isso, que viver bem é conseguir conquistar a partir de nossos recursos, e não pelo acaso dos acontecimentos. Também quero desfrutar do que é bom. Mas não consigo crer numa satisfação que não surge do comprometimento com a realidade. Sem perceber, repetem a tragédia de Fausto, de Goëthe: em nome de uma vida plena de maravilhas, pactuam com as trevas e perdem a própria alma.

Efeito estilingue

O desejo de conhecer o futuro deriva de uma incapacidade de perceber-se no momento presente. Ora, em 99% dos casos, o meu amanhã será resultado do hoje – do que eu pensar, fizer, sentir, evitar. Não nego aqui o imprevisível, aquilo que se atravessa em nosso caminho e frustra planejamentos. Mas, convenhamos, essa é a exceção e não a regra.

Uma série de fatores fez com que 2015 fosse interpretado como um ano difícil. Mas essa ideia foi sendo revestida por uma força, que potencializa o dano. Tudo aquilo em que mobiliza nossa crença tem poder – assim nascem os deuses e os demônios. Só teremos um bom 2016 se mudarmos essa concepção.

Para começar, temos uma tendência enorme a querer melhorar, mas não valorizamos as conquistas que alcançamos. Perdemos o hábito de celebrar os avanços. Olhamos para trás para lembrar o mal que nos fizeram, ou para alimentar uma nostalgia do “era feliz e não sabia”. Mas não usamos o exercício da memória para avaliar a nossa capacidade de transformação, que só testamos por causa das adversidades enfrentadas. As pessoas que mais admiro não são as agraciadas pelo destino, e sim aquelas que souberam reconhecer capacidades para aplicá-las da forma mais eficaz.

Escolhas equivocadas

Queremos ir a um determinado lugar sem exatamente sabermos de onde estamos partindo. E isso inviabiliza qualquer rota. É preciso fazer uma avaliação justa da nossa situação atual antes de requisitarmos qualquer mudança, de fazermos qualquer cobrança.

Não me faltam queixas de quem se ressente por não ter algo, por acreditarem que ali residirá a felicidade eterna. Depois de moverem céus e terra para alcança-la, percebem o erro. Veem que se atrelaram a uma condenação e buscam alternativas para reverter o feito – assim como Fausto, ao tentar escapar de Mefistófoles, a personificação do mal.

Queria eu poder intervir no que o tarot traduz. Segue a lista das previsões que idealizo. “Em 2016, escaparás de seduções vãs. Saberás escolher o que realmente condiz com o que és, não cederás às pressões do mundo. Não perderás tempo com ideais padronizados de felicidade instantânea. Tudo será mais simples. Reconectarás tua alma, tua centelha divina, a única força capaz de te conduzir nos tortuosos trajetos. Aprenderás que a vida boa é aquela que é bem vivida.”

Psique: Natal dos excluídos – a medida exata da dor

crédito: Metrópoles

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“Quem muito se ausenta, uma hora deixa de fazer falta pode estar passando por sérios problemas e necessitando de um abraço amigo”. Foi ao ler essa mensagem, escrita exatamente assim, que surgiu essa reflexão para o Natal. Outros escreverão sobre o perdão, a saudade, a solidariedade, a alegria. Eu não.

Falarei sobre o Natal do sorriso amarelo. Do olhar distante, da fala para dentro, das mãos desconcertadas. Daqueles que se veem inadaptados ao período de celebração, uma vez que não conseguem encontrar motivos para comemorar. E que, mesmo assim, fazem um esforço descomunal para parecer bem. Mas que, no fundo, não compreendem o motivo da demagogia festiva.

Para estes, a solidariedade festiva não parece razoável. Especialmente porque parecem que só são enxergados nessa época. Ao longo do ano, são mantidos num campo de invisibilidade que beira o desumano. Não são ouvidos em suas angústias, em seus medos, nas dificuldades que não conseguem superar.

Ajuda dispensável
Dissimular uma alegria tornou-se um ato-reflexo. Afinal, transparecer algum desconforto com a vida não parece razoável aos demais. Quando assinalam aquilo que lhes incomoda, surge uma série de indagações. “Mas para que ficar assim?” “Não está na hora de esquecer isso e tomar uma atitude?” “Além desse assunto, o que você está fazendo de bom?”

Quando não são questionamentos, são opiniões. Eu acho isso, eu acho aquilo. Só mudam os tons: condolente, indignado, professoral. E, nessas horas, a criatura se arrepende de ter dito a verdade, em vez de ter mentido uma satisfação. Deseja ser surdo. Deseja não estar ali. Deseja não ser ninguém. Alguém se aproxima, chama para uma selfie, e dissipa o “clima de baixo astral” – no ambiente, mas não no coração de quem sofre.

Muitos só reconhecem a depressão no outro quando o estado já chegou aos níveis patológicos avançados. Ou seja, quando o comprometimento funcional já chegou em um patamar alarmante. Não percebem os sumiços, os silêncios, a apatia no olhar, o desinteresse. Não leem a gravidade das estratégias de compensação encontradas no álcool, na comida, na medicação, no Netflix.

Respeitar a dor
Vivemos num mundo em que o espaço para a angústia está ficando cada vez mais restrito. É como se a dor e o sofrimento fossem incompatíveis com a realidade. E, a partir desses moldes, somos convidados diariamente nos cegar a tudo aquilo que parece murcho, opaco, desencaixado.

Se o mal estar aparece, o jeito é buscar de forma instantânea. Ou seja, medicar. A notícia é velha, mas convém ser rememorada: em 2007, foram vendidas no Brasil 29 mil caixas de clonazepan, o Rivotril – “rivo”, “gotinha mágica”, “melhor amigo”, dentre outros apelidos carinhosos que já ouvi no consultório. Este ano, de janeiro a setembro, foram mais de 18 milhões de caixas.

“Rivo” e seus colegas são ferramentas importantes e respeitáveis para o tratamento de transtornos psíquicos. Como tal, a única prescrição segura é a feita pelo médico psiquiatra – e o que mais vejo é a receita que vem do gineco, do dermato, do cardiologista, pois “ir no psiquiatra é muito pesado”. E, dessa forma, o medicamento se transforma num mero silenciador de angústia. Eles anestesiam os sintomas, mas não mexem nas questões que os despertaram.

E, para muitos, uma dose será o aperitivo da festa de Natal. E, ao retornarem para casa, tomarão outra, para digerir o vivido. Não por preferirem assim, mas por não encontrarem alternativa viável. Em grande parte dos casos, tal alternativa se chama relação, um encontro sincero.

Nessas festas, olhe em seu redor com sensibilidade e certamente encontrará, bem perto, alguém que precisa de você. Mire nos olhos, abrace com entrega, escute de forma plena. Se não sabe o que falar, cale. Sem falsas palavras de incentivo, ou de reprovação. O que o outro precisa é da sua presença, para sentir-se respeitosamente percebido e valorado no que é. Juntos, poderão construir um respiro para a dor, a possibilidade de uma noite feliz.

Psique: Honestidade, uma virtude para cultivar

Fonte: Metrópoles

a clerk walking on the nose of a devil trying to maintain a balance between time and work

 

Quando olho para você, sei o que enxergo. Você pode até não corresponder àquilo que interpreto. Mas só mesmo o tempo e os fatos poderão me promover outra leitura. Sei que o mesmo ocorre daí pra cá. Mas vivemos numa sociedade, dita civilizada, e precisamos manter uma relação cordial, respeitosa. Mas só isso.

No entanto, não alimentamos mutuamente uma linguagem de hipocrisia. Afinal, há algo entre nosso olhar que nos impede de acreditar que “nada está acontecendo”. Reconhecemos que, apesar de qualquer divergência de propósitos, isso nos une: sabemos o mal-estar que se impõe entre nossos corpos.

A lucidez que temos ao admitirmos tudo isso, silenciosamente, nos eleva a um patamar especial, o das pessoas sinceras. Somos honestos com o que sentimos, com o que acreditamos, com o que esperamos da vida. Não se trata de avaliar se estamos certos ou errados nas nossas opiniões. Mas somos genuínos, ao menos nessa relação. Essa característica já nos diferencia de uma grande massa – para melhor.

Simplificar a vida
No mínimo, nossa vida fica mais fácil. Não precisamos nos policiar para evitar deslizes, mentiras ou evitações. A falsidade nos tira a espontaneidade, e isso é uma lástima. Quase nada nessa vida merece que deixemos de ser o que somos em nome da expectativa dos outros. Talvez somente a compaixão mereça esse sacrifício.

Obviamente, a vida pautada na honestidade é mais parca. Não temos tantos amigos, convites e ocupações. E é justamente disso que parte a sensação de libertação. Muitas das demandas que “perdemos” representam, na verdade, um acréscimo. Sobra tempo e energia – nossos recursos mais caros – para o que realmente faz diferença em mim.

A atitude legitimamente honesta depende desse senso de justiça. E a balança não apela para a autoindulgência ou autocondenação exageradas. Ela é exata, encontra a medida certa para o tamanho que conseguimos ocupar a cada momento, a depender de cada situação. Não ser nem a mais, nem a menos. O primeiro e mais difícil dos passos para atingir essa virtude: ser honesto consigo e, a partir daí, olhar para fora.

Contextualize-se
Dessa forma, perceberemos que não temos condição de cobrar aquilo que não estamos dispostos a oferecer. O sujeito honesto sabe contextualizar-se no mundo. Não só a partir dos limites que recaem sobre si, mas principalmente diante daquilo que pode fazer em nome dos demais. Por essa razão, podemos entender que da honestidade brota a verdadeira solidariedade, a relação saudável com o outro.

Minha avó já dizia: cada um só dá o que tem. Erramos quando, para parecermos melhores, queremos oferecer o que não estamos dispostos a compartilhar. Seja um gesto, um sentimento, uma atitude. Mesquinharia não é negar, é oferecer com finalidades não declaradas. Admiro profundamente quem não dissimula intenções, e encontra uma forma sábia de declará-las. São pessoas em quem busco inspiração.

E é em nome delas que nego, que acolho, que brigo, que sorrio. E é a elas que dedico meus melhores momentos. É delas que espero a parceria, o lado a lado, os ensinamentos. Dos demais, aprendi a não esperar nada. A não ser distância.

 

Ler e Saber: Freud x Jung

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Fui convidado para prestar consultoria à revista Ler e Saber “Freud: a vida e as teorias do pai da psicanálise”, para uma reportagem da publicação sobre a relação entre ele e Jung. Para acessar o conteúdo, é só clicar na imagem.

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