Self

Outras Ondas* – A arte de ser educado

Por favor, obrigado, silêncio ao escutar, gentileza e atenção com os demais. Valores que remotam à vida em sociedade se transformam em artigo raro entre crianças e adolescentes. Ter educação foi promovido a um elogio, em vez de ser uma obrigação. Muitas vezes, força-se uma assimilação entre o comportamento de baixa civilização com a espontaneidade e rebeldia inerentes às essas fases do desenvolvimento humano. Admitamos: não sabemos como educar nossos filhos.

Crianças e adolescentes vivem o ápice da ausência de limites. É como se, ao assim serem tratados, fossem contemplados com uma dita liberdade. Há ao menos três décadas, educadores e psicólogos alertam para a ausência de preparo para no exercício da maternidade e da paternidade. A dedicação excessiva ao trabalho afasta pais e mães da convivência necessária com os filhos. Abrem mão disso numa busca incessante pelo ter, sem perceberem que, aos poucos, passam a mercantilizar também as relações afetivas: conquistam-se filhos com presentes, em vez de carinho e confiança. Consequentemente, eles aprendem que o desenvolvimento pessoal depende do que conseguimos acumular de riquezas na vida, além de desenvolverem um egoísmo exacerbado diante do que é “seu”.

Oferecer limites é ensinar que a unipotência não é um atributo humano. Consequentemente, aprende-se a lidar com as frustrações e desenvolve-se o poder da resiliência: a elasticidade diante das adversidades, com o intuito de manter-se íntegro em vez de ceder à deformação. Perde-se assim a chance de aprender a sábia lição de que “o que não nos mata nos fortalece”. Uma pessoa que não admite dificuldades não lida bem com as frustrações. E, para evitá-las, tentará burlar regras ou desenvolverá um poder de destruição quando se sentir contrariada. Ou, numa situação extrema e cada vez mais comum, sucumbem às drogas e à marginalidade.

A boa educação não depende de boas regras, e sim de bons exemplos. Içami Tiba afirma que educar é orquestrar o crescimento. Ele defende o conceito de cidadania familiar, onde as regras de dentro de casa devem valer na rua, e vice-versa. Não existe indivíduo educado, e sim família educada.

Esse talvez seja o grande desafio ao pensarmos as próximas gerações. Cobramos o que não temos, e que não estamos dispostos a desenvolver. Cultivamos a intransigência, mas queremos filhos maleáveis. Optamos pelo caminho mais fácil para a resolução de nossos problemas, mas queremos crianças íntegras. Mantemos uma postura extremamente competitiva, e sentimos vergonha ao percebê-las tacanhas e raivosas diante de uma derrota.

Um indivíduo sem limites tem uma dificuldade imensa para entender o sentido do verbo cuidar. Não consegue conjugá-lo consigo mesmo e nem com os outros. A educação, nesses moldes, prescinde o exercício do compromisso e da responsabilidade. Educar é entender que algo que é ruim precisa e pode ser melhorado. É despertar à consciência de que cada ato, palavra ou intenção gerará consequências capazes de alterar – positiva ou negativamente o cenário que se tem em redor. É desenvolver a empatia, o “colocar-se no lugar do outro”.

Tais pensamentos aproximam bastante o gesto de educar com o desenvolvimento de uma ética. Revisa, assim, conceitos distorcidos de felicidade. A única forma de corrigir as incongruências biopsicossociais do mundo contemporâneo é investir na valoração do ser e do servir – em vez do ter e do aproveitar. Para que nossas crianças e jovens entendam que esses valores merecem atenção e dedicação, vão antes precisar de bons exemplos. Antes de desenvolver qualquer senso crítico, o ser humano aprende a viver por assimilação de imagens experimentadas. Desenvolver a própria educação é a melhor fórmula para educar.

nivas gallo