Muitos pais debatem sobre a necessidade de promover um ensino religioso entre as crianças. Diversas vezes, sob o argumento de conferir a liberdade para que os filhos possam ter a autonomia de escolha sobre a crença a seguir. No entanto, como em qualquer fator da educação infantil, os referenciais domésticos serão decisivos na formulação de uma imagem interna de Deus entre os pequenos. Mesmo que na vida adulta venham a abraçar novos dogmas religiosos, estes estão sustentados sobre a base aprendida na infância.
A espiritualidade deve ser um dos valores necessários para que o sujeito possa se sentir realizado. Os benefícios que ela proporciona não são superáveis por boas relações sociais, ou pela intelectualidade. Sendo assim, ela deverá ter sua importância reconhecida no processo de educação.
Mais que valores de fé, os fundamentos religiosos apresentados às crianças podem favorecer-lhes a lidar com diversos outros aspectos da vida. Basta lembrar que a religião é um dos principais caminhos para promover a reflexão ética. A verdadeira espiritualidade está embasada na ética, respeito e compaixão: a fraternidade para reconhecer no outro um semelhante, mas com particularidades que o transformam em alguém único. O indivíduo que se familiariza mais cedo com essa realidade tem mais facilidade para ser um agente de justiça social, sentem a tolerância como um caminho natural da espécie. Aprendem a dividir, a desenvolver a empatia – colocar-se no lugar do outro.
Independentemente da religião, o conceito de Deus é permeado por uma série de atributos. Justiça, misericórdia, lealdade, amor, proteção, severidade… Muitos deles, de difícil compreensão formal – mas altamente tocantes quando sentidos. Deus é imaginado como algo grande demais para ser percebido pela razão. Mas é justamente por ter esse tamanho que o divino ganha a capacidade de acolher os problemas e anseios humanos. Essa sensação de amparo é importante para que a criança possa desenvolver em si o otimismo e a sensação de capacidade diante dos desafios que o mundo impõe. “Se Deus é por nós, quem será contra nós?” Ao mesmo tempo, ao entender Deus como uma imagem de totalidade e superioridade, a criança aprende sobre os limites diante da vida. Percebe que a onipotência é um atributo sobrehumano. Reconhece-se, assim, com limitações humanas, reagindo com mais segurança e resiliência diante de frustrações.
A Psicologia Analítica ensina que a busca do homem por Deus é fruto da necessidade de integração de elementos da psique. O somatório dos elementos da consciência e do inconsciente, ou seja, a totalidade psíquica, é denominada Self. Ao nascer, a criança está imersa no mundo do desconhecido, da inconsciência. Somente na medida em que o tempo passa, que ela passa a ganhar conceitos sobre si e sobre o mundo que a cerca – formando assim núcleos de consciência. O Self corresponde à nossa natureza mais individual e diferenciada, a qual buscamos desenvolver no decorrer da vida. Dele derivam as marcas que conseguiremos imprimir no mundo.
Por corresponder à ideia de totalidade, o Self também corresponde à imago dei, ou seja, à imagem de Deus que carregamos internamente. Ela é formulada a partir das diferentes experiências vividas com o mundo divino – seja a partir de um milagre presenciado ou das crenças herdadas pelos nossos antepassados. Neste sentido, quanto mais cedo surgir o primeiro contato com a divindade, mais forte será essa imagem de Deus. E qual a utilidade disso? Ao reconhecer em um ato ou conceito os propósitos de Deus, ou do Self, aproximamo-nos de uma sensação de realização, de dever cumprido diante da existência. Familiarizar-se com Deus nos ensina a seguir os sinais que conduzem à realização dos desígnios da alma.