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Outras Ondas* – Uma vida além da vida


O cinema nacional quebrou, recentemente, mais um recorde. O filme Nosso Lar, inspirado na obra homônima de Chico Xavier, ultrapassou a marca de um milhão de espectadores nos cinco primeiros dias de exibição. Todos interessados em conhecer uma versão do que seria a vida após a morte, de acordo com a crença espírita. Para construir tal realidade, o roteirista e diretor Wagner de Assis não poupou recursos nem tecnologia: a obra também tem o marco de ser a produção mais cara da história nas películas brasileiras, com orçamento estimado em R$ 20 milhões. É o Avatar à brasileira.

Mas certamente não é a tecnologia o que mais atrai tanta gente desejosa de conhecer o Nosso Lar. Nem também a convicção no espiritismo: três de cinco amigos que assistiram o filme seguem outra orientação religiosa. Na verdade, o que os conduziu à escolha foi a curiosidade sobre o que estaria além da morte – uma das questões existenciais do homem.

O Brasil, país de maior adesão ao kardecismo, também é rei na miscigenação das crenças. Propicia, por exemplo, que um católico tome um passe vez por outra, sem que isso traga um conflito sobre a própria fé. Chico escreveu a obra em 1944 e, até hoje, ela é a mais vendida entre seus livros. Nela, a continuidade do espírito é marcada por situações que conhecemos bem: trabalho, filas nos meios de transporte, alimento para o corpo (astral, no caso), regras, disciplina, modernos centros de comunicação, doenças e tratamentos médicos… Algo bem distante da plácida e romântica ideia de vida eterna!

É essa a realidade complexa que o médico André Luiz encontra ao adentrar na cidade espiritual. Relatos que, na crença, ele transmitiu a Chico por meio da psicografia – a escrita mediúnica, prática dos espíritas. A continuidade do espírito após a morte do corpo é a base para todas as religiões. Nelas, encontramos respostas para nossas inquietações mais profundas, damos sentido à vida – e assim o é desde a formação das civilizações. Para o psiquiatra suíço C.G. Jung, fundador da Psicologia Analítica, a crença nos espíritos é reforçada sempre que há uma distorção dos valores humanos. “A percepção de uma realidade espiritual arranca-o constantemente dos laços que o prendem a um mundo puramente sensível e material, e lhe incute a certeza de uma realidade espiritual cujas leis ele deve observar tão cuidadosamente e com tanto temor quanto as leis da natureza física circundante”, ensina em A natureza da psique (Ed. Vozes).

Partindo dessa óptica, a corrida aos cinemas ultrapassa a curiosidade. Ela evidencia a eterna busca, a necessidade de resgate da espiritualidade – independentemente de conceitos religiosos. Nosso Lar e as demais obras que falam da vida além-túmulo não nos levam a refletir sobre a morte. É justamente o contrário: buscamos, com elas, uma justificativa para viver. Algo que nos conforte e valide os esforços cotidianos de sermos pessoas melhores.

* A coluna Outras Ondas é publicada aos domingos no blog da Revista do Correio: www.correiobraziliense.com.br

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