Self

Outras Ondas* – O começo, o fim e o recomeço

Na série sobre orixás, hoje abordo as forças primordiais de vida e morte: Ibejis e Nanã, presentes no começo e o fim da existência.

IBEJIS

Dois pequenos bonecos esculpidos em madeira representam uma das divindades mais dinâmicas do panteão afro-brasileiro: Ibejis, as crianças gêmeas. Distinguem-se dos demais orixás por apresentarem-se sempre em pares, um dependente e relacionado ao outro. Obviamente, também representam o antagonismo presente no arquétipo dos gêmeos: o que é força em um, é a fraqueza do outro; o que um quer o outro rejeita. Traduzem, desta forma, a natureza dual do homem: o desejo e a necessidade, o ser e o não-ser.

Como deuses crianças, apresentam também a docilidade e a leveza (beirando o descompromisso) como características primordiais. Ibejis são alegres, brincalhões, talentosos e perspicazes. Apontam sempre para soluções criativas, inovadoras. Afinal, é deles o poder de começar uma nova tarefa (tudo o que já existe e terá um desenvolvimento, de uma planta a um projeto, sofre influência dos Ibeijs). Mas também são caprichosos, ciumentos, egoístas e teimosos, características que se apresentam principalmente quando não são atendidos de pronto.

O culto do candomblé associa a figura dos Ibejis a outra manifestação especial: os erês, os representantes infantis dos orixás, que se apresentam junto aos neófitos desde o momento da iniciação na religião. Os erês surgem como os portadores da voz dos deuses: transmitem aos homens as suas vontades, descontraem o ambiente durante os períodos de reclusão no noviciado, ensinam e aprendem os detalhes do culto. São donos de hábitos pouco ortodoxos e pouco polidos: se não educá-los, exageram nas brincadeiras e se tornam impertinentes. No entanto, são vistos com bastante respeito, de utilidade ímpar na religião.

NANÃ

Nanã é o barro primordial, de onde foram retirados os elementos para moldar a figura do homem. É também aquela que recebe os corpos daqueles que cumpriram a trajetória de vida. Nanã é a morte temida e respeitada, mas inevitável para a manutenção da raça. Dona dos pântanos e das águas paradas, é tida como a mais velha entre as grandes mães do panteão jeje-iorubá. Também é a chuva fecunda, que oferece a renovação da existência. Seus fundamentos são cercados por mistérios, assim como a sua própria face: transmite a verdade contundente das limitações humanas, sendo assim temida pela maioria dos mortais. Muitas vezes, eles a reverenciam para evitá-la: movimento contraditório de quem tenta barganhar com a ceifadora em nome da longevidade.

A ausência do uso de metais no culto a Nanã aponta a uma existência remota, anterior ao domínio do ferro pelo homem. Assim acreditam os seguidores do candomblé, que justificam o ocorrido com a divergência existente entre a deusa e o orixá Ogun (o ferreiro). Nanã até aceita ser cultuada por homens, porém só se manifestará em iniciadas do sexo feminino. É a justiceira daquelas que sofrem nas mãos tiranas do poderio masculino.

O poder de retirar a vida também se reverte na força das sementes e grãos, que são de domínio de Nanã. Ela expressa a renovação da vida, que conduz sempre com a calma e a sensação de domínio do tempo – tudo acontece na hora certa, acredita. Conduz a vida e os compromissos com rigidez e responsabilidade, que espera encontrar nos demais. Muitas vezes, luta contra as próprias emoções para manter o controle das situações e administrar os problemas com mais justiça e em prol da coletividade. É a “avó”, ora amável e doce, ora disciplinadora e severa. Em seu olhar calmo e andar lento, Nanã nos ensina a conduzir a vida com mais serenidade.


Outras Ondas* – Graça, doçura e caprichos

Dou prosseguimento à série mensal sobre os orixás com a família real de Ijexá: Oxum, dona das águas e do ouro, e Logun, o filho dileto, príncipe encantador.

OXUM

É a mulher fecunda, de beleza voluptuosa, rainha das terras africanas de Ijexá. Considerada a mais bela entre os orixás, é dona de todas as riquezas, especialmente do ouro – cor que predomina em suas vestes e ornamentos. Oxum é doce em sua voz e gestos, gosta dos rebordados e renascenças, com os quais nutre uma de suas principais características: a vaidade. Tanto que o seu principal adereço é o espelho dourado. Luta, no entanto, contra o sobrepeso – fruto do culto ao prazer da mesa, especialmente dos doces. Tem apreço pela moda e ousa, criando tendências. É a mulher que mais se banha, que mais se cuida e mais se perfuma. Está associada às águas doces e límpidas – nascentes, lagos, rios calmos. E os sábios garantem: tome cuidado com águas paradas, elas escondem riscos sem demonstrá-los…

Oxum tem a generosidade entre as suas virtudes. É uma anfitriã nata, com requinte e diplomacia. Mas não esconde de ninguém que também gosta de ser bem servida. Tem seus gostos e sabe garanti-los, mesmo que, para isso, use de um quê de manipulação. As lágrimas robustas são usadas para demonstrar a sensibilidade exacerbada, mas também para dobrar aquele que se mantém resistente diante de seus caprichos. Oxum tem o dom da visão, é mística por natureza. Suas profecias soam como sinas para os mais medrosos. Apesar de gostar do conforto e da tranqüilidade, não foge das tarefas que lhe são atribuídas. É guerreira e caçadora – mas só quando há necessidade, prefere mesmo é cuidar da casa e de si própria.

Como a mais fecunda, Oxum assume o papel da mãe que gera, que procria. A gravidez e a amamentação são as fases que mais a marcam. A privação desses papeis por qualquer circunstância soam como elemento de frustração. Protege os bebês. Oxum é seio que alimenta, doce cuidado que transforma sua companhia (e proteção) em privilégio.

LOGUN

Do romance entre Oxóssi, o mais astuto e perspicaz, com Oxum, a mais bela, nasce o grande príncipe dos orixás: Logun, ou Logunedé – este último, com referência ao título de caçador. A natureza de Logun engloba características essenciais de ambos. Isso é representado miticamente pela natureza andrógena do orixá: durante seis meses do ano, ele é mulher e mora no fundo dos rios com a mãe; no restante, é homem, mora na mata e vive da caça, junto com o pai. Eis o motivo de um dos seus principais símbolos: a balança em equilíbrio.

Logun é o deus menino, o arquétipo do puer aeternus, o que se nega a crescer. Logun é aquele que cativa sem esforço, é naturalmente envolvente. Seduz com um quê de inocência, mobilizando homens e mulheres. É um pavão. Eloquente e fantasioso, é companhia agradabilíssima, dificilmente acumula inimigos – quem o desaprova é por pura inveja. E assim consegue manter-se no centro, nutrido pelo mimos dos demais. Mas basta tentar deslocá-lo desse eixo para que percebamos uma parcela de egoísmo que o compõe. Logun é ciumento, possessivo e, como uma boa criança que é, faz birra para ter a vontade atendida. Mas até assim ele se transforma em algo gracioso.

Logun é determinado, sincero, perfeccionista e gosta de uma boa polêmica – não dispensa uma fofoquinha. Joga com a dualidade que lhe é peculiar. É o cavalo marinho – metade cavalo, metade peixe. Mas nem sempre vencem os conflitos internos: são cheios de dúvida e, apesar da casca de determinação, muitas vezes se sentem superficiais, inconstantes e indecisos ao extremo. No entanto, tudo isso é compensado com seus dengos e tiradas inteligentes. O prazer de Logun pela vida faz com que ela valha a pena.

Outras Ondas* – O fogo do amor

Dando continuidade à série sobre orixás, falo hoje sobre Xangô e Oyá (ou Iansã). O casal mítico divide o domínio sobre o fogo: elemento que os une a partir dos atributos da força e da passionalidade.

XANGÔ

O governante da cidade de Oyó personifica todas as características do rei mítico, envolto em uma aura de soberania, justiça e inteligência, que despertam o fascínio de seus súditos. Xangô é o homem de boas palavras, sempre muito bem escolhidas e pronunciadas de forma vibrante e emotiva. É forte, temperamental e assume muitas vezes um tom professoral, ficando irado quando suas verdades não são reconhecidas pelos demais. Torna-se assim autoritário e presunçoso. É extremamente social, preferindo a casa cheia, onde oferece grandes banquetes – a fartura é motivo de orgulho para qualquer rei. Tem uma forte inclinação pelas questões humanitárias e pelos problemas dos outros. É um hedonista: não se renega aos prazeres do corpo, sejam eles praticados pela boca ou pelo sexo. Defende, inclusive, essa liberdade para todos. Por esse motivo, é considerado o amante ideal, pois não se preocupa somente com o próprio prazer. Vaidoso e sedutor, é narrado nos mitos como aquele que trança os cabelos e usa argolas nas orelhas.

Nas narrativas míticas, Xangô convivia com três esposas em um palácio suntuoso: Obá, Oxum e Oyá, que, volta e meia, lutavam entre si pelo título de preferida do rei. A virilidade e a fertilidade são marcantes em si. Tais atributos estão ligados ao apego passional que Xangô tem à vida: teme a morte e os mortos como ninguém. Esse orixá tem no fogo o seu elemento primordial. Como tal, é intenso, marcante e transformador.

OYÁ OU IANSÃ

A mais audaciosa entre os orixás femininos, Oyá surge no panteão afro-brasileiro como a mulher forte, guerreira. Gosta de enfrentar inclusive os homens, porém não se distancia da feminilidade. Entende que a sedução é uma arma poderosa demais para ser desprezada. Adora praticá-la: é a mulher livre, ama sem culpa, e acaba usurpando dos amantes que cativa seus principais atributos. De tão destemida, Oyá enfrenta até mesmo os mortos: por esse motivo, ganhou a função de controlar os eguns (espíritos), quando esses tentam interferir de forma negativa no mundo dos vivos. Iansã é a dona dos nove céus, mãe de nove filhos – que ela administra e defende com o amor de uma leoa, apesar de não ser uma daquelas mães que mima em excesso. Tem a sede da liberdade, e, por isso, dá logo cedo a independência para que esses filhos desenvolvam a individualidade e possam ganhar o mundo. A batalha é o seu grande orgulho e, inclusive, torna-se intransigente quando julga que o outro segue a lei do menor esforço ao lidar com os combates da vida.

Oyá é vento fresco e também tempestade. Graciosa e matreira em alguns momentos, forte e impulsiva quando provocada. Grande feiticeira, tem uma magia intensa no olhar: reze para que Iansã nunca lhe deseje algum mal. Ciumenta e temperamental, não se importa com o olhar repressor dos outros quando está tomada pelo calor dos acontecimentos. A curiosidade é a sua grande fraqueza. Instigada a descobrir o segredo de Xangô, Oyá acabou experimentando do feitiço do fogo. Passou, desde então, a soltar labaredas pela boca e pelas narinas – literalmente, é uma mulher com fogo nas ventas. Na ritualística, esse mito é simbolizado pelas bolas de algodão e azeite em chamas engolidas pelos iniciados em transe, e também pelo acarajé (akara = bolas de fogo; njé = comer), sua comida predileta. Ela também risca o céu com o fogo dos raios, seguidos sempre pelo estrondo do trovão – a voz de Xangô reclamando seus domínios. Iansã é a paixão nossa de cada dia, a coragem que impulsiona mulheres (e seus defensores) a conquistarem espaço num universo predominantemente masculino.

Outras Ondas* – As serpentes sagradas

Na série mensal sobre orixás, abordo hoje Oxumaré e Euá, as serpentes sagradas responsáveis pelo dinamismo e pela renovação da vida.

OXUMARÉ

Originário do Daomé, é o grande orixá da nação Jêje-Mahi, onde recebe o nome de Bessém. É representado por uma grande serpente, que liga o orum (céu) ao aiyê (terra). Nessa conexão, ele também é o encarregado de trazer a água aos homens, a partir da chuva. Está associado assim à fartura e à riqueza: pensemos que, na aridez africana, a chuva é a maior dádiva que se pode ter, por propiciar a vida. Oxumaré também é representado pelo arco-íris e, como ele, representa a diversidade. Assim como uma cobra, Oxumaré tem a facilidade de adaptação às situações mais difíceis e faz questão de reinventar-se constantemente, como quem troca de pele. Tem a capacidade de ler a situação nas entrelinhas – por isso, miticamente, é visto como o grande babalaô (olhador de oráculos). A predileção por tudo que é misterioso, mágico, contribui com este fim.

Oxumaré conduz conflitos com sagacidade. É do tipo que não se iguala aos inimigos: planta situações para que a verdade se manifeste. Gosta, inclusive, dessa aura de mistério que envolve o seu nome. Comentários com sentidos dúbios e frases não-terminadas podem inspirar desconfiança no outro, que pode enxergar um tom de maledicência nos seus gestos, palavras e, principalmente, em seu silêncio. Tem um humor refinado, costumam ser despachados e interessantes.

Tem cargo de liderança, gosta do poder e não esconde a ambição. Elegante, oscila entre roupas extremamente sóbrias e acessórios chamativos e caros. Dotado de uma beleza andrógena, atrai pessoas de ambos os sexos e não tem tabus no que diz respeito à orientação sexual. É, definitivamente, um orixá marcante.

EUÁ
Se temos Oxumaré como o que traz a chuva à terra, temos em Euá o orixá que promove a evaporação da água de volta para o céu. Dona do céu avermelhado de fim de tarde e das estrelas, divide com Oxum a primazia sobre os olhos d’água e nascentes inexploradas dos rios. Nesse elemento da natureza, Euá manifesta uma de suas características mais marcantes: a virgindade e a pureza. Essa imagem imaculada, traduzida num excesso de recato e polidez, muitas vezes é usada para ocultar a natureza fria e intransigente, de língua afiada. Euá é, ao mesmo tempo, frágil e contundente. Uma bruta flor, de beleza exótica e encantadora.
Constantemente em refúgio, se transforma numa caçadora exímia. Como tal, aprende a lidar com a paciência e desenvolve um quê arredio ou reticente diante do novo, do ameaçador. Assim como Oxumaré, tem uma percepção extrassensorial grande, sendo tida como o orixá da vidência. Essa ligação forte com o mundo espiritual a transforma em uma pessoa devotada e preocupada com o bem-estar coletivo. Porém, se mal conduzido, essa predileção pelo misticismo poderá levá-la a desenvolver um olhar fascinado diante de Deus, ou até mesmo ao fanatismo religioso. Baseada nisso, entrega-se com facilidade aos votos de castidade.
A força e truculência do masculino é um fator perturbador para a virginal Euá: sente-se incompreendida pelos homens e, muitas vezes, mantém-se distante deles. Intransigente, pode sofrer com a responsabilidade das próprias decisões. Tende também a dramatizar os próprios problemas, como se eles fossem insuperáveis ou maiores que os de outrem. Mas, quando conquistadas, se transformam em “cobras de guarda” dos amigos, que não são tantos assim. É atenta e inspiradora.

Outras Ondas* – Os divinos curadores feridos

Esse é um capítulo importante nesta série mensal sobre orixás. Nele, falamos de três orixás de extrema importância no panteão afrobrasileiro: Omolu ou Obaluaiyê, Ossain e Iroco. Todos são divindades associadas ao poder da cura dos males do corpo, da alma e do tempo. Neles, se revela a irônica impotência dos curadores: enquanto fornecem o alento às mazelas dos demais, sofrem com as dores das próprias feridas – a rejeição, a solidão e a imobilidade.

OMOLU

Omolu-Obaluaiê é um dos orixás mais cultuados no Brasil, principalmente pela associação que tem como o médico dos pobres. Ele é o dono da terra e tem forte relação com o fogo. Torna-se assim o regente das moléstias epidêmicas e infectocontagiosas, que, como lavas de um vulcão, levam a febre ao corpo. Pode propagá-las ou curá-las, a depender do humor e do senso de justiça. Ganhou essa atribuição a partir de um mito que remete à sua infância: ele teria sido contaminado pela varíola ainda enquanto bebê. A imagem terrível do filho doente teria sido forte demais para Nanã, sua mãe mítica, que decidiu abandoná-lo no mangue. Obaluaiê foi resgatado pelo instinto maternal de Yemanjá, que o acolheu e tratou. Para ocultar as deformidades provocadas pela doença, Omolu recebeu de Ogun o azê, uma espécie de capuz feito com longos fios de palha que encobrem rosto e corpo. A indumentária é usada pelos iniciados quando estão manifestados com a energia do orixá.

Apesar de Yemanjá ter promovido o reencontro de Omolu com Nanã, com quem voltou a morar, o ressentimento nunca deixou de ser uma marca no coração dele. Omolu é, ao mesmo tempo, carente e resistente a esse sentimento: não admite a pena dos demais e se desdobra em forças para não depender de ninguém – mesmo que, intimamente, sinta que mereça mais atenção. No entanto, o rancor se dissolve quando alguém tenta compreendê-lo. Torna-se um amigo extremamente fiel, capaz de sacrificar a própria felicidade para trabalhar em prol do outro. Essa aliança é celebrada na festa do Olubajé, a grande ceia de Omolu, quando ele recebe os demais orixás para um banquete – à exceção de Xangô, seu grande rival. Obaluaiyê carrega em si as dores da terra e também propicia a manutenção da vida. Ele é o pó do qual fomos feitos e para onde retornaremos.

OSSAIN

É o orixá que tem a primazia sobre as folhas, elemento indispensável para estabelecer a saúde e também para os rituais no candomblé. Ele é o grande feiticeiro, que vive entocado nas matas, naturalmente o seu grande domínio. Traz o encantamento em sua natureza selvagem. É astuto, inteligente, mas prefere o isolamento e a solidão: custa a surgir e não oferece garantias de retorno. Vestido de folhas, camufla-se com facilidade e também consegue imitar a voz dos pássaros para garantir o destino incerto.

O mistério e a liberdade são atributos genuínos em Ossain. Conta-se que um pássaro pousa sobre a cabeça dele para contar as novidades do mundo – por mais ausente que possa parecer, consegue se manter atualizado de tudo. Ele é caprichoso e mantém o domínio do que é seu. Diz o mito que, chateados com o egoísmo de Ossain, que guardava todas as folhas para si, os orixás “encomendaram” a Iansã uma grande ventania para que as espalhassem na floresta. Assim, cada um catou as folhas que pôde. Mas elas simplesmente não tinham poder quando não usadas com os encantamentos recitados por Ossain: assim, ele manteve a relação de dependência dos demais. Ossain nos ensina sobre o controle e o equilíbrio, imprescindíveis para conquistar grandes objetivos. É um extremo devoto da natureza e nos inspira a respeitá-la.

IROCO
Ao chegar em uma casa tradicional de candomblé, de longe poderá avistar uma suntuosa árvore, com copa opulenta e laços brancos enfeitando o tronco. Ali está Iroco, o deus-árvore, cultuado como o pilar que existe entre o céu e a terra. O orixá é firme como os arbustos que o representam: seguro, tradicional, determinado. Recentemente, há uma tentativa de resgatar a imagem de Iroco no Brasil, a partir da iniciação de novos seguidores a este orixá – talvez um sinal da necessidade de resgate das tradições africanas, tão corrompidas pela vaidade e pelo dito progresso.

Em algumas vertentes do candomblé, Iroco é associado ao tempo. Nos ensina, dessa forma, a entender o valor das horas, dos dias e dos anos – medidas necessárias para nos atrelarmos à realidade. Mesmo não sendo literalmente perene, ele é aquele que acompanha gerações. É a segurança presente na ancestralidade, tido por muitos como a casa dos antepassados. Nos ensina o grande valor da resistência às variações. Aquilo que é o seu grande valor também pode se transformar numa condenação: conduzir regras a ferro e fogo, ter um quê de intransigência à plasticidade das situações e sofrer com adaptações fazem parte da sina de Iroco. No entanto, observá-lo nos propicia a sabedoria para entender que raízes profundas são a segurança de um grande desenvolvimento.

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