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Nós, analistas, somos acusados de inquisidores da família. Talvez porque, vez por outra, soltemos o jargão: “não está na hora de matar o pai, matar a mãe?” Força do hábito, às vezes um hábito perigoso. Esse é um texto de retratação, ou quase.
Afinal, é na nossa família de origem que alcançamos os nossos primeiros tesouros. Os afetos, as crenças, os valores: a herança que ficará conosco – até que, de posse de algo melhor e autoral, eu possa abdicar dela. Mas não há de se descartar tudo, definitivamente.
É no seio familiar que acessamos nossos primeiros provérbios, os primeiros ditados. Lá temos o primeiro contato com a sabedoria popular. Ela nos ensina, a partir de metáforas de fácil compreensão, as prerrogativas que conduzirão nossas escolhas. A partir delas, compreendemos acontecidos, moldamos relações, tomamos decisões.
Experiências repetidas
Um valor se origina, basicamente, da experiência. Ou seja, da associação de um atributo a algo vivenciado. Nossa família nos transmite valores mesmo que não o faça de forma consciente. Os mais firmes vêm a partir do que testemunhamos. Com eles, aprendo a ser um ser humano digno, respeitoso, ético. “Quem sabe provérbios não pode ser de todo mal”, como dito em “O fabuloso destino de Amélie Poulain”.
O exemplo vale mais que palavras, certamente. Mas é a partir delas que eu conjugo o fato, elaboro uma sentença a partir dele. Isso me ajudará a balizar a vida, torná-la menos problemática. Os dizeres populares nasceram com essa função: aprender estratégias com nossos antepassados para evitar erros, sofrimento e dor.
É claro que há provérbios contraditórios entre si. E que a escolha por um, ou por outro, será definida por uma série de fatores psíquicos, das crenças que envolvem os indivíduos que os repetem. O valor é subjetivo, contempla a partir do contexto e da necessidade de cada um. O que falamos aponta para aquilo que nos é importante.
Para um mundo melhor
Nossos valores são sementes para a nossa ética. Ela vai além do moralismo, das regras às quais estamos submetidos por mera convenção social. Brota de dentro, será constituída a partir da conciliação daquilo que acreditamos, com nosso temperamento e nosso caráter. É a soma do crer, sentir e agir, determinará a forma como me situo no mundo. Aquilo que valoro é a amálgama que unifica esses fatores e determina quem eu sou diante do outro.
A formação de um cidadão ético vai além de dinheiro e oportunidades – ela carece de bons exemplos, boas frases, de reverência aos que o antecederam. Faltam provérbios, sobram acusações. Falta visão do coletivo, transborda o egoísmo – comportamentos típicos de valores falhos.
Para quem se preocupa com a ética, a revisão dos valores é um exercício de praxe. Busco me manter na linha. Mas, se eu exagerar, lembrem-me que tenho limites. Se eu negligenciar, lembrem-me que tenho compromissos. Se me distanciar dos sentimentos, lembrem-me que é com eles que me nutro. Lembrem-me quem sou. E se eu insistir em negar meus valores, estarão todos autorizados a esquecerem-se de mim.