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Não sou de uma família tradicional, no sentido pomposo da palavra, mas trazemos conosco crenças que atravessam gerações. Superstições, inclusive. Na casa de minha mãe, algumas palavras eram mais proibidas do que palavrões. Miséria, desgraça, peste, praga…
O argumento é de que, quando chamamos tais palavras, elas poderiam atrair para debaixo do teto o seu significado. Uma coisa meio “O segredo”, décadas antes do lançamento do best-seller. Atraímos o que chamamos, sejam bênçãos ou maldições.
O tempo e a profissão me fizeram perder esse medo. Não de todo. Teria como ser diferente? Meu ofício me ensina a lidar com as misérias humanas, sendo elas das mais distintas espécies. Essa lida, tenho uma função educativa de nominá-las. Só é possível combater o que foi reconhecido.
A ideia da desgraça é um dos principais temores humanos. Não queremos imaginar que Deus nos deu as costas. Na imagem divina, encontramos a ideia de um amparo para que suportemos as adversidades, estando elas fora ou dentro de nós.
Da mesma forma, quando abençoamos alguém (o que é comum nesse jeito tradicional que cito), o que se busca é uma dupla afirmação do sagrado: em mim e no outro. É como se emprestássemos nossos braços para acolher, suplementando provisoriamente o abraço divinal.
Esse é um traço comum por validar uma necessidade psíquica: o progresso, derivado da integração de fatores desconhecidos ou dissociados. Assim como acontece quando esperamos que Deus ofereça um sentido. Quando o caos se instala sobre as coisas do mundo, quando o que vemos não encontra sentido na nossa lógica.
Ao evocarmos uma bênção, recorremos, de forma humilde e submissa, a essa parcela sagrada que nos habita. Conferimos a ela um poder que, no fundo, nunca lhe faltou. Mas que o ego, em sua visão limitada e tendenciosa, pode querer tomar para si. Em vão, por mera incompetência.
Essas são algumas das razões que fazem da Psicologia Analítica uma vertente bastante atenta à religiosidade. Jung, inclusive, foi acusado diversas vezes de ser mais místico que científico.
De fato, ele reconhecia o mistério e a busca do significado como os grandes cernes da psique humana. Ao fim da vida, já não se importava tanto com os créditos pejorativos que lhe davam: ele não acreditava em Deus, ele “sabia” Deus.
Da mesma forma, as bênçãos e maldições que nos chegam no consultório, nos discursos dos clientes, são observadas com o respeito e a reverência devidas. Terão sempre a importância que lhe são creditadas. Seria um absurdo querer destruir algo tão importante para a realidade do indivíduo. Afinal, nunca sabemos qual é a viga mestra, a que sustenta toda a edificação.