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Correio Braziliense: Simpatias, superstições e cores para o réveillon

O Correio Braziliense publicou hoje uma reportagem da jornalista Mara Puljiz sobre simpatias e superstições de ano-novo. Colaborei com informações sobre os rituais e com dicas de cores para a hora da virada. A reportagem, na íntegra, está disponível abaixo. E minha participação no parágrafo em destaque.

Confira algumas dicas de cores e simpatias para começar 2011

Escolher uma cor especial para as roupas, comer lentilhas, guardar caroços de romã, fazer oferendas a Yemanjá e pular três vezes com o pé direito segurando uma taça de espumante são alguns dos rituais muito praticados na passagem do ano. Mesmo quem não é supersticioso costuma aderir ao momento místico

Mara Puljiz

Contagem regressiva para 2011. Faltam dois dias para o réveillon e é hora de refletir sobre o ano que ficou para trás. Momento de reviver as alegrias e pensar positivo para os 365 dias que virão. Felicidade, dinheiro, amor, paz e saúde são os desejos mais comuns. Mas não basta desejar. Para garantir boas vibrações em 2011, há quem acredite na força das cores e nas simpatias (veja quadro). Usar branco para ter paz, comer lentilhas ou guardar caroços de romã para sempre ter dinheiro, usar calcinha rosa para conquistar uma nova paixão, entre outras, estão entre as superstições mais tradicionais para atrair prosperidade. Quem faz garante que dá certo.

A estudante de administração Sarah Jaber Cardoso, 21 anos, costuma passar o réveillon vestida de branco. Este ano, grávida do primeiro filho — se chamará João Gabriel —, a jovem quer usar algo diferente para trazer sorte e saúde para o pequeno, além de felicidade ao lado de Márcio Leandro Macedo, 24, seu namorado. Sarah ainda não decidiu pela roupa, mas garante que a escolha dependerá do seu estado de espírito, em sintonia com o significado de cada cor. Ela está na dúvida entre vermelho, verde e amarelo. Supersticiosa, ainda promete comer três caroços de romã, em homenagem aos três Reis Magos, e guardar outros quatro deles enrolados em uma nota de R$ 2 dentro da carteira durante o ano inteiro, sem gastar a cédula. No ano seguinte, a nota será doada. “Acredito muito nessa simpatia. Faço isso para não faltar dinheiro dentro da carteira e tem funcionado”, garantiu ela.

Sarah mora no Setor Tradicional de Planaltina e compartilha com a família as simpatias. Quando o relógio marca meia-noite, ela e todos de casa também não deixam de comer lentilhas. “Normalmente fizemos festa em família. Este ano, todo nós vamos comemorar a virada numa chácara. Tudo o que eu quero para 2011 é muita paz e saúde para o meu filho, João Gabriel. É um ano muito especial para mim”, destacou.

Sal grosso
A estudante de direito Ana Paula Bezerra Godoi, 23 anos, não se considera supersticiosa, mas há quatro anos não abre mão de tomar banho de sal grosso na noite da virada. “É regra eu fazer isso porque acredito que o banho limpa tudo de ruim que aconteceu no ano”, explicou a moradora de Sobradinho. Por influência de uma tia, Ana Paula também costuma usar calcinha amarela. “Não parei para ver se melhorou, mas na dúvida, eu uso”, diverte-se. Quem também compra uma peça íntima a cada réveillon é a babá Cleuza Bento Rodrigues, 37 anos. No ano passado, a moradora do Paranoá vestiu três calcinhas diferentes —uma branca, uma amarela e outra vermelha. “Usei uma em cima da outra para trazer paz, amor e esperança.”

Desta vez, Cleuza resolveu apostar na calcinha branca. “Esse ano eu quero mais paz e felicidade”, explicou. A par das preferências dos clientes, os comerciantes investiram nas compras dos acessórios mais diversificados. Nas lojas do Plano Piloto, é possível encontrar modelos de calcinha com o trevo da sorte e o emblema da cédula. “Todo dia saem umas quatro dessas aqui. As clientes estão procurando muita peça assim para passar o ano-novo”, disse a vendedora Raíssa Siqueira Reis, 18 anos.

Na casa do servidor público José Fernandes Melis, 49 anos, na QE 26 do Guará II, é tradição cada membro da família comer 12 sementes de uva verde e um punhado de lentilhas. “É assim há 10 anos. Acredito que traz sorte e vibrações boas”, avaliou. José passou a usar camisa amarela no ano-novo, mas antes não acreditava muito nas crenças e simpatias. Depois de ouvir tantas pessoas comentarem, resolveu experimentar. “Foi uma curiosidade que despertou em mim e que deu certo. É bom a gente acreditar. Até agora tem dado certo em todos os aspectos, como na saúde e financeiramente. Mas tendo saúde e paz é o que importa de verdade. O resto a gente corre atrás”, disse.

Questão de fé
Para o tarólogo e analista junguiano João Rafael Torres, os rituais constituem um dos valores culturais mais importantes da humanidade. “Acredita-se, inclusive, que tenham ajudado a moldar a vida em sociedade, se pensarmos neles como a origem de todas as religiões”, completou. João Rafael acredita que quando se faz um ritual, como as simpatias da passagem de ano, cria-se um marco para o momento. “Os elementos escolhidos evocam sempre um valor simbólico do que se deseja atrair ou afastar. Por isso, é comum ver o uso de sementes e moedas em rituais de prosperidade.” Mas o tarólogo lembra: nada flui quando não se crê no que foi feito. “Só a partir da crença é que conseguimos mobilizar a energia psíquica necessária para promover a transformação desejada. O ritual é uma forma de marcarmos internamente nossos propósitos. Ele promove uma conexão simbólica com o inconsciente, que proverá com respostas e transformações para nossa vida”, ensina.

Outras Ondas* – Que entrem os bem-vindos

Muitos brasileiros não ficam sem um bom pé de comigo-ninguém-pode próximo à porta de casa. Ou, então, logo do lado da entrada, instalam uma carranca de olhos arregalados e sorriso assustador. A jornalista Glória Maria já declarou ter dois vasos enormes de vidro: um com carvão, outro com sal grosso, bem às vistas de quem chega. Outros mantêm sementes de olho-de-boi em um copo com água, atrás da porta, pelo lado de dentro: quando a semente eclode ou afunda, está na hora de refazer a receita. Na onda do feng shui, espalharam-se nos halls dos partamentos pequenas bolas facetadas de cristal ou espelhinhos oitavados, pendurados acima do olho mágico.

Discretos ou ostensivos, todos esses símbolos têm o mesmo significado: funcionam como um filtro para deter ou repelir energias intrusas que tentem invadir o lar — ambiente sagrado de epouso e alegria, onde somente as pessoas queridas são bem-vindas. A tradição é milenar. No livro de Êxodus, no Antigo Testamento, é o próprio Deus quem ordena marcar as portas das asas com o sangue de um cordeiro entregue em sacrifício. Assim, estariam livres da morte e das pragas.

Entre as casas do interior, é comum encontrarmos uma pequena cruz feita em palha de palmeira ornamentando a soleira. Ela é confeccionada com folhas abençoadas no Domingo de Ramos, que antecede a Páscoa e representa o retorno de Jesus a Jerusalém, antes do martírio. Manifestação do catolicismo popular, capaz de proteger a casa dos males e da fúria dos fenômenos da natureza — era o que dizia minha avó. Outros garantem a eficácia das ferraduras: elas devem ser presas com as pontas para cima para atrair sorte. Senão, atraem o contrário. Xô!

A mezuzá, usada pelos judeus, também é um símbolo que se mantém vivo por milênios. Ela consiste em um pequeno pergaminho em couro, onde estão escritas, à mão, orações. A confecção e fixação na porta da casa obedece a uma série de ritos e restrições. Mais que um simples amuleto, a mezuzá é um símbolo da fé entre os israelitas.

Para os adeptos do candomblé, o batente e a soleira da porta são, por primazia, pertencentes aos orixás Ogun e Exu. Ambos estão associados à defesa contra inimigos e à abertura de caminhos. É de Ogun o mariwô, folhas da palmeira de dendezeiro desfiadas que, presos sobre portas e janelas, impedem a entrada de espíritos perturbadores nas casas e terreiros. Também é comum encontrar espigas de milho adornando os umbrais das portas. Chamam a fartura, garantem os fiéis.

Há alguns anos, recebi de presente uma pequena flauta de bambu que, segundo orientaram, deveria ficar sobre a porta de entrada. A função: dar sinceridade às visitas, para que falem o que pensam, sem crivo, pudores ou falsidades. Anos depois descobri que o instrumento é usado no feng shui para atrair o chi (energia positiva).

O que muitos interpretam como tola superstição cria, na verdade, um conforto psíquico para quem acredita. Ao ver a carranca, o mezuzá ou a flauta, a mente aciona a ideia de proteção e, mesmo que não entendamos como tudo isso funciona, nos sentimos melhores. O que une todas essas crenças (e outras milhares que não couberam aqui) é a fé, a nossa melhor defesa.

* A coluna Outras Ondas é publicada aos domingos no blog da Revista do Correio: www.correiobraziliense.com.br
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